UMA ANÁLISE DAS COMUNIDADES VIRTUAIS SOB O ENFOQUE SOCIOLÓGICO DE PIAGET

 

Resumo

Este artigo visa promover uma reflexão das comunidades virtuais a partir do enfoque sociológico de Piaget. Pressupõe-se a existência de três características para a formação de uma comunidade: interação, colaboração e a cooperação. Estas características podem ser encontradas isoladamente, bem como, integradas nas próprias ações das comunidades virtuais.

 

Palavras chave: comunidades virtuais, interação, colaboração, cooperação e escala de valores comuns.

 

 

Elementos constitutivos das comunidades virtuais

As comunidades virtuais estão presentes nas infovias, nas relações binárias que interligam boa parte de todos os países do nosso planeta. Elas existem para o desenvolvimento de ações comuns para um determinado grupo de pessoas, que possuem interesses e objetivos afins, seja para o desenvolvimento de pesquisas, estudos, intercâmbio de informações ou, simplesmente, para ampliar possibilidades de potenciais ações.

Os elementos que compõem uma comunidade virtual podem ser agrupados em quatro blocos interdependentes que são: ambiente físico e lógico, pessoas, objetivos comuns e atitudes cooperativas.

Ambiente físico e lógico

O ambiente físico e lógico das comunidades virtuais são compostos por todos os elementos físicos, desde o computador, o modem, a linha telefônica, os cabos e demais elementos de uma estrutura física que possibilite o acesso à rede de computadores. Os elementos lógicos são as estruturas mentais binárias, ou seja, toda e qualquer opção de software utilizado para o acesso, a comunicação, a pesquisa e a construção de novos saberes que estão disponíveis na Internet; são os programas utilizados para o acesso à Internet, programas de correio eletrônico, de sala de bate-papo, de busca de informações, de desenvolvimento e publicação de home-pages, bem como, todos os demais que estiverem à disposição dos ambientes virtuais.

Pessoas

Compõe o grupo de pessoas, todos os indivíduos que participam das atividades de comunidades, sendo que esta participação se dá com ações de interações, colaborações e cooperações. Estas pessoas estão juntas para o desenvolvimento de ações comuns, independentemente, das posições geográficas que se encontram; elas possuem interesses comuns e estão dispostas a compartilharem novas experiências, informações e atitudes.

Pressupõe-se que as pessoas que estão envolvidas nas comunidade virtuais possuem autonomia para suas ações, visto que, dentre um dos princípios de uma comunidade, podemos citar o respeito mútuo, a igualdade, a liberdade de expressão.

Objetivos Comuns

O agrupamento entre pessoas está relacionado ao desenvolvimento de ações que visam atingir objetivos comuns. Os objetivos comuns são a razão de ser de uma comunidade virtual, é para o objetivo comum que a comunidade virtual existe e se mantêm. Toda comunidade virtual possui uma intencionalidade que é compactuada com todos dos seus membros e a partir desta intenção é que são formuladas as ações que serão desencadeadas.

A definição das intencionalidade estipula um marco inicial para os agentes de uma comunidade e a sua própria revisão de ser faz parte integrante como uma melhoria, avanço e equilíbrio da comunidade. Os objetivos comuns não necessitam ser fixos, pelo contrário, estão sempre sendo revisto visando garantir uma atualização conforme as demandas que surgem a partir das próprias ações dos membros da comunidade e das ações que esta comunidade sofre do meio onde está inserida.

Atitudes cooperativas

Segundo Piaget (1973), as realidades sociais são compostas por regras, valores e sinais. Entende-se por regras as normas e os sistemas de obrigações que os indivíduos compactuam entre si, são pressupostos acordados formalmente entre os integrantes de uma sociedade, comunidade. Os sinais são os símbolos, convencionalmente, utilizados para representar as expressões das pessoas e entre as pessoas. Os valores são resultados da aplicação das normas, são os sentimentos e sensações oriundas das normas.

Nas relações entre as pessoas de uma comunidade, ocorrem trocas de valores que podem ser realizadas entre duas ou mais pessoas, sendo que a troca de valores desencadeia uma série de atitudes entre quem age e recebe a ação do ator. O ser humano, ao agir com outra pessoa, promove uma reação, seja esta uma devolutiva na prestação de um serviço, seja numa ação material ou numa ação virtual (aprovação ou censura).

As atitudes de quem desencadeia uma ação, presta um serviço para outro, é oriunda de um sacrifício, de uma renúncia atual, satisfação, dispêndio e ou de um crédito. A pessoa, ao receber esta ação, adquire uma dívida, um benefício, uma renúncia virtual e ou um benefício atual. Para que haja uma relação de equilíbrio entre os membros de numa comunidade é necessário que exista uma escala de valores comuns, que haja entendimento, que estejam de acordo e possuam gostos semelhantes. Essas características mantêm a coletividade necessária numa comunidade, uma coletividade co-valorizada, ou seja, interajam segundo suas escalas de valores comuns, de tal forma que proporcionem benefícios recíprocos.

As comunidades virtuais são, essencialmente, compostas por atitudes cooperativas, as quais ocorrem em situações de um ambiente propício à cooperação. Entende-se por ambiente cooperativo aquele que é formado por pessoas com escala de valores comuns, sejam valores duráveis ou não, podendo ser heterogêneo ou não, entretanto, os interesses e gostos apesar de poderem ser individuais, não perdem sua importância coletiva, são compartilhados e entendidos por todos.

Os ambientes cooperativos proporcionam para seus integrantes sentimentos de segurança, liberdade individual, confiança mútua, liberdade de pensamento, respeito à dignidade. Caso ocorra a ruptura da escala comum de valores, esta relação entre as pessoas deixa de ser cooperativa, proporcionando situações conflitosas desfavoráveis. As escalas de valores são indicadores de avaliação e de comparação, visto que para cada indivíduo, todos os objetos e todas as pessoas que o interessam são suscetíveis de ser avaliados e comparados segundo algumas relações de valores, relações que constituem precisamente uma escala (Piaget, 1973).

As comunidades virtuais são compostas por ambientes cooperativos. Nos ambientes cooperativos ocorrem: interações, colaborações e cooperações.

Interações

Os membros de uma comunidade virtual estão em constante interação, promovendo interações consigo e com seu meio, as interações são internas e externas e proporcionam novas reflexões e mutações, sejam duráveis ou não. Eles estão diante de relações de reciprocidade, de comunicações bilaterais, de troca de informações. As condutas entre os membros de uma comunidade está relacionada ao seu contexto, à sua socialização, não se pressupõe condutas individuais isoladas, sem relações com outros ou outras. As interações entre os membros de uma comunidade estão relacionadas às suas questões históricas, sendo que estas estão acima das interações individuais. É quase impossível dissociar o ser de suas relações sociais, sua perspectiva psicológica está associada à sua perspectiva histórica e social. Suas atitudes sincrônicas (atuais) estão associadas às questões diacrônicas (históricas).

A interação pressupõe a existência de mais de um membro numa comunidade, é uma relação de cruzamento e interseção. A interação é hipertextual, ela ocorre em todas as direções entre todos os membros da comunidade.

 

 

Interação (reciprocidade entre duas ou mais pessoas)



  • J

J

 

 

Colaboração

Entende-se por colaboração a reunião das ações que são realizadas isoladamente pelos parceiros, mesmo quando não fazem na direção de um objetivo comum (Estrázulas, 1999). Numa comunidade virtual, a colaboração apresenta-se como uma ação voltada para uma mesma intencionalidade, para um mesmo objetivo comum, entretanto, são ações somadas que se somam, não são ações que, necessariamente se integram, não formam um todo em sim, são ações isoladas. Poderíamos interpretar graficamente a colaboração da seguinte forma:

 

Atitudes Colaborativas numa Comunidade Virtual

Imagine três membros de uma comunidade virtual que estão interagindo entre si.


desenvolve ação X1 e chega na posição

P2


desenvolve ação X2 e chega na posição

P2


desenvolve ação X3 e chega na posição

P3

As atitudes colaborativas promovem crescimento e deslocamento, entretanto, não possuem uma interdependência entre elas. Para que ocorra a colaboração, também é necessário a existência da interação, visto que atitudes colaborativas, também pressupõe-se uma relação entre os membros envolvidos, apesar, de não haver a construção em conjunto, não ocorre a operação conjunta.. Nas colaborações acontecem as ajudas, que podem ou não ser mútuas, são ações de acréscimos, de doações.

 

Cooperação

Atividade que integra as ações de interação, colaboração e desenvolvimento de operações em comum. A cooperação é resultado de ações sinérgicas, as operações efetuadas em comum ou em correspondência proporcionam resultados maiores que a soma entre as partes, ela propõe novos formatos. As atitudes de cooperação pressupõe igualdade de direito e autonomia para seus participantes. A liderança é situacional e circula pelos membros conforme cada uma das atitudes desenvolvidas, o que promove o equilíbrio na participação de todos os membros. Os membros de uma comunidade virtual em atitudes cooperativas estão em constante reciprocidade, apesar dos diferentes estilos e personalidades existentes. As atitudes coletivas são valorizadas, sobrepondo-se ao individualismo, ao egocentrismo. Para lidar com atitudes cooperativas é necessário que o ser esteja socializado, se auto perceba, caso contrário, lida com uma socialização inacabada, gerando conflitos e pouca ou nenhuma construção. As mentalidades tribais são excluídas destes grupos.

Para que haja um equilíbrio cooperativo entre os membros de uma comunidade, ou agrupamento, são necessários:

Atitudes Cooperativas de uma Comunidade Vitual


 

 

Colaboração

Meio Externo

Contexto

Atitudes

Circulares

 

 

 

 

Conclusão

As ações de interação, colaboração e cooperação não são lineares, uma atitude não é mais importante que a outra, entretanto, para que haja cooperação é necessário a existência de atitudes de interação e colaboração. Nas atividades desenvolvidas nas comunidades virtuais, podemos verificar a existência destas três atitudes, entretanto, nem sempre as tr6es ocorrerão simultaneamente.

Uma atitude de interação pode ser desenvolvida visando apenas o enfoque de relacionamento entre os membros de uma comunidade, mesmo que ainda não estejam operando em conjunto. Algumas ações nestas comunidades possuem intenções apenas colaborativas, atendendo a uma demando em específico.

A interação apresenta-se como um dos elementos mais constantes numa comunidade virtual, ela é o insumo básico para o processo de aprendizagem em ambientes virtuais. A interação é uma atitude bilateral. Também podemos verificar que algumas ferramentas disponíveis nos ambientes virtuais podem favorecer mais ou menos os efeitos de interação, colaboração e cooperação. O desempenho das ferramentas disponíveis nos ambientes virtuais podem ser melhorados de acordo com a mediação pedagógica que os professores, juntamente com os alunos, optarem para o desenvolvimento das atividades.

Percebe-se, também, que uma participação mais efetiva nas atividades disponíveis nas comunidades virtuais são oriundas da resolutividade das questões físicas, conhecimentos básicos dos recursos disponíveis, dos reais interesses dos participantes e, não menos importante, o contexto cultural dos membros desta comunidade.

Apesar das comunidades virtuais apresentarem uma grande oportunidade para a extensão presencial do aprendizado, ainda é cedo para afirmar se é necessário a existência nos momentos presenciais ou não, visto que em alguns casos percebemos que o momento presencial tem sido a "mola" propulsora, enquanto em outros casos, o momento presencial chega a apresentar-se como um dificultador e uma desculpa para não termos uma boa participação dos momentos virtuais.

Bibliografia

ESTRÁZULAS, Mônica. Interação e Cooperação em Listas de Discussão, Revista Informática na Educação – Teoria & Prática, UFRGS, Outubro, 1999, Pág. 81 a 86.

FAGUNDES, Lea da Cruz; MAÇADA, Débora Laurindo. SANTAROSA, Lucila Maria Costi e TIJIBOY, Ana Vilma; Aprendizagem Cooperativa em Ambientes Telemáticos, Revista Informática na Educação – Teoria & Prática, Abril 1999, Pág. 19 a 28.

PIAGET, Jean. Estudos Sociológicos. Rio de Janeiro, Forense, 1973.